domingo, 28 de fevereiro de 2010

Ditirambos (incompleto)

Desejo esvair-me pelo discurso.
Abrigo dois leões ao meu peito.
Se as mãos enlaçam com jeito
faz-se presente a doce epifania.

Noite de minha agonia
deserto de alma onde em vão procuro,
onde está aquela sintonia
que me vem libertar do claustro escuro?

Agora lembro-me bem.
Se tudo já eu não trouxesse fora de mim
estaria tudo em alguém,
um simples botão de rosa e a vida é carmim...

Essa ânsia não é correta, sinto-me aquém,
assim, a noite passa,
alastram-se minhas cercanias, mas não me sinto além,
o corpo é uma farsa;

Tão bem temperado é cravo que me ata,
e os cinco sentidos que me limitam,
queriam pagar o homem com o que o mata,
não é à bela coisa o que imitam,

tecelãs de si, as pobres almas?
Ama os fios quem não os doura,
criança loura,
tens os finos pontos em laços, tua manta,
lavai teu rosto, refaz-te pia e levanta!

Que é que sabe a tua mão macia
da potência ativa de te produzir a túnica?
Por que cada face é, enfim, única
se a silhueta robusta da maçã dura só um dia?

A música, vida dos homens, estende a melodia.
O fio de prata na horizontal parte,
segue o curso do rio e pressagia,
que a luz dos olhos não soará feliz sem arte.

A chuva cai, como o destino pesa a forte harmonia!
Na queda o fado, acompanha o ai,
No solo busca as molas para a branca nuvem enlaçar,
os seus cachos encaixam, e por instantes perde o ar...

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Alada Cidadela ao Sol

Pelo amor à palavra,
Sublime ponte,
Para cada estado d'alma,
Fiel guia,
Saibamos habitar,
De modo novo,
A cada dia,
A mui digna morada.

O olhar breve,
O gesto exangue...
O passo leve...
Langue, todo poente
Prenuncia a alvorada.

Força & Vigor

F.'.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Vida sonora da palavra

O segredo da vitalidade
reside nos ritmos,
o mais pequeno é
trecho de uma verdade
desde que música sentida,
suficiente na voz do sileno.

Admiro o modo sincero
com que os orientais
antigos estão convencidos,
nisso sem afetação:
somos nós deuses -
e o pensamento
é o criador do real.
Força ativa de afirmação.
Para o obsoleto, destruição.

Gosto de,
experimentar na citadina
alteridade o espólio
e o estranho modo como
o novo encontra lugar
entre os sempre antigos,
na fusão formidável dos estilos.

O que não nos enfatua
faz de cada vista
algo ímpar.

Delírio!

Ó criança taciturna
das expansões de outrora
quisera tê-la invadido
com egípcia unção...

Corto-lhe as veias e arremesso-lhas
fora... as hemácias em ebulição...

O que seria de nós
se arruinássemos a função?

Ligas que não atam nós,
façam laços, nos deixa sós.
Ascética sinergia do repente a hora,
desviar a alavanca do fulcro e gozar fora:

da meta que é o eterno,
sejas sempre afirmação.


quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Literatura

a beleza não se compra
só pode ligar-se virtude
afim assim como a pele
e a lânguida olfação de
suas perplexidades faz
da carne o manjar barulhento
das murmurações suculentas,
o dulçor e o trago,
limalha cicatrizante
dos rusgos rasgos
pelas resistentes vielas
da arquitetônica interna
dos afetos vicejos, id est,
do cajú que é a coisa mesma
e da 'literatura',
que é sua sombra
e seu outro.