sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Casa Vazia

 I hit the ground


Dos ancestrais o musgo,
o jardim, a pegajosa cidreira,
a ladeira cujos cantos coam a chuva...

Da casa materna, nunca dada,
as estendidas pernas ao chão
por um colo...

Fluxo de minha presença
pelos cômodos sem descanso,
para lá e para cá,
por não ser daqui ou dali

Cerâmica e pedra,
terra, frio solo
de que me via transportado
a cada vez,
a tornar-se ladrilho e pó

Então me via só
a fitar derradeiro
o que já não era lar

De costas para o futuro,
por que voltei lá?

A transparente presença,
a memória, o corpo-tempo
do inconsciente se ergue tal fantasma

Ao alento constrange asma

Estará a caverna n'alma,
a outra gruta e o jazigo?

Por que fui ter lá,
novamente, de costas para o presente,
onde nada, ninguém, nem sinal havia?

Que são essas coisas que ao soalho
se misturam ao olvido?
Minhas coisas?
Quem as deitou fora tal cascalho?
Que imensa fúria
essa a desintegrar-me?

Baixo o olhar,
e ergo do rodapé 
até alto o teto:
qual o sujeito?

Mundo
Retábulo, objeto
A casa e a viúva...

Nem manta, nem travesseiro,
a pedra por descanso
de meus dias inteiros

A árvore sagrada
O leito de ametistas
O lago da consciência

Pelo pomar se permuta
o árido deserto,
pela atroz agência,
apego e desapego,
que a paisagem transtorna

Por que deixei o Leste
e viajei a Oeste?

Que perdi, que recolhi?
Onde o fôlego?
Por que tão longo ess' exílio?

O filósofo pergunta
e as mãos junta em apelo:
Que é a casa,
pedra, argamassa,
tijolo e telha,
madeira e metal,
ou o em vistas de quê se a ergue?

O poeta perscruta o dia da noite 
e vê 
das imagens, sombras fugidias...
e que 
das coisas quando joeiradas
restam as palavras,
da presença, o nome,
dos dias, a fome...

João Pessoa, 23/10/2020



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