sábado, 3 de outubro de 2009

Duas Poesias

I - Rex

Um pouco do que nada soube dizer...
Um tanto do que nada disse.
Tão pouco o que em nós resta do ser:
O nome, a palavra e a sombra,
O que por fim, envolve a coisa...

Tudo menos em nós a meiguice,
A verdade guarda-a nos baús de outrora.

Tanto é pouco o que disse,
Diante tudo quanto mo disse sem falar.
Impossível, entanto, refazer o que faria!
Rejubilar até a velhice.

Se me daria o trabalho, sem deslocar-me a sandice,
Pois a avalanche tumultua e cresce no peito...
As palavras agarram-se umas às outras,
Com pressa e medo de jorrar...

Atabalhoa o sentido e desce, vai buscar!
Trás de volta, gira, entontece e alteia...
Os braços enquadram a lua quase cheia,
E a maré é de todo já um ser imenso...


Vive o sangue em minhas veias...
Córrego fiel, murmúrio e cheia,
Febril primavera e frutos na feira.

Azáfama de palavras no silêncio
Que me faz prazenteira a vista
Que minha morte sega e clareia.

Pena que para ti isso se esconde.
Oculta lá e te digo não sei onde,
A profusão dos gestos – incendeia;

O olhar vivo, e o riso de teu fito,
O que não me conhece, vê-me feliz:
Onde a ânsia cresce...
Sem pedir licença.

Não te fito, hirto desisto.
O amor é grande e a lua cresce.

Despeja-se sobre mim o peso insone
Que não é mais que uma pena leve.

Não carece te cobrar o que ao outro desse
Ao me chamar de irmão: desconheces-me.

Fausto tapete em que se esvaia minha sina.
Pudera ao menos me palmilhar o sangue
Roto, rude e coalhado.

Tresmalharam-se ao som dos sinos
As ovelhas que com o coração apascentava.

Esconda-se de mim o archote!
Ou vibro a lenha plena em fogo:
Sibilante e farto como há por dentro.

Ando a não mais poder
E a morte me transtorna o dia...

Toda a natureza se compraz em ser
Toda ela correspondência e guia.

Se não sabe o homem como caminha
A toda a forma reja, amada minha!
Por que esperávamos de si tu e eu?
‘Caso pelo que há de ser... Eterno?


II – Lucis

Minha alma é uma lâmpada
Que se apagou e ainda está quente
.
– F. Pessoa.

A vida rubra vibra
E seu ardil oculta.
Murmura sutil e timbra
Ares de água profunda
Que se esvai... Ausculta!

Vida primaveril,
Que se abre e que permuta,
Desabrocha no peito a carne febril,
Corre profusa nesse leito de rio
Até que a morte se faça em leito.

Embalsamadas pedras postas sem jeito,
Pois com jeito já seriam diferentes e falsas;
Fingidas se não fossem o que são, com efeito.

Substituís por carne e células a pulsar
Indo encontro ao peito do macro cosmo
E verás surgir o edifício terno e incerto.

Como que há de vir, perto de longe...
Em uma cela? Com que assombro?

Ouço o porvir pelo oco que há por vir
Entre a substância que não cessa...
Porém, não em mim...

Em mim as coisas são ternas,
Não eternas não.
Vivas porque se vão...

Coloridas, em suas cores próprias!
Que não estão para além da mão...
Que, contudo, não as capta.

Fogem-se borboletas multicores,
Aos borbotões dos falsos amores,
De tons fluidos e flores alegres...
Tesos músculos sedutores...

Expandindo pela
Pele dimanando em escape
Batimentos de cores doridos
Abandonados à inanição
Bem contritos.

Pobre da alma que só tem ao mundo –
Mudo, cego e surdo!
Aos clamores da multidão.

Bitte gib mir nur “oh!”.

30 de setembro de 2009.

Um comentário:

Assunção disse...

Prezado Hórus: agradeço por sua visita ao meu blog e por seu registro. Espero que no decorrer dos proximos escritos possamos trocar idéias. Abraço, Luiz Assunção.aa