sábado, 12 de dezembro de 2009

Revista Orpheu

Ao público,

As reuniões eternas dessa empresa multitudinária produziram uma demanda inolvidável de espaço, ou foro público, onde as discussões acadêmicas da amizade sapiencial, nobre ocupação dos estudantes de filosofia e arte, da Universidade Federal da Paraíba pudessem ser veiculadas. Assim expressamos nossa carta de intenções ao público. De antemão, tais reuniões se fazem desde que dois ou mais estejam reunidos (§ 1). A tradição assim toma a palavra e emerge como potência no interior da instituição e do mundo.

O nome da revista inspira-se e visa recuperar os motivos da revista lusa Orpheu, editada por Fernando Pessoa e Mário de Sá Carneiro, a partir de 1912. Os jovens promissores a frente da revista partiram de uma inquietação contra as convenções classistas e classicistas, nós, por outro lado, partimos do descontentamento com a ignara casta de nossos contemporâneos que nada lêem e apenas perpetuam o establishment. Visamos à erradicação, através da crítica virulenta e do silêncio escarnecedor, de todas as formas tacanhas e parasitárias. A violência lingüística e o rigor são então as premissas de nossa qualidade crítica e produtiva. Em Filosofia e Arte, é preciso o instante destrutivo, para limpar caminho para a criação e o novo. Seguindo essa premissa, o tema “Surgimento da Filosofia”, nos permitirá salvar a antiguidade das incompreensões e realizar, para o público, o nosso conceito de Filosofia e Arte desde os antigos. Cientes de que a força não se dá, toma-se, ocupamos há algum tempo os espaços públicos, em que muitos quedaram estáticos, e ousamos nos fazer saber, através da palavra. Os que são pródigos dela, não percebem que todo proferir é errar às coisas. Que todo ato de fala deve ser artístico, por princípio. O saber é uno, a linguagem é que vela a realidade com as idiossincrasias individuais, toscas e enfadonhas.

A nobre simplicidade e a grandeza são nosso estilo, por excelência. Destinamos a nossa mensagem não às massas, antes exterminá-las conceitualmente, mas ao verdadeiro círculo artístico e filosófico, necessariamente restritos. Não se devem profanar as empresas como a nossa, de tão sublimes propósitos, com uma exposição inútil e prematura ao desagrado da plebe, que nada entende e tudo condena.

A revista Orpheu é, então, reservada aos Resistentes, que sabem ao deleite do diálogo profuso como o rio em suas águas profundas.

O conteúdo da revista versa sobre o título simbólico de Orpheu, patrono da Filosofia, das Artes e da Religião dos Rituais Iniciáticos. Prepara os movimentos de escalada, de apoteose lingüística, do acúmen com que a acuidade visual ou estética, coadunada com a visão intelectual das coisas, em unidade discordante de si mesma, que antecipam a descida do poeta aos infernos.

Parafraseando Goethe, no edital de sua revista Propileus, somos “amigos unidos harmoniosamente” [ou não], destinados os olhares às grandes e pequenas coisas autênticas, a natureza, a arte e a filosofia, em atenção aos artistas, os dignos produtores de tesouros no interior da língua, observadores ativos, isto é, espreitadores que nascem e nutrem-se com luz do dia e o reflexo da noite, no emprego prático de suas partes às comunicações, das constelações entre si. Evitamos a unilateralidade e a bitola, perigo freqüente contido em toda a ideologia totalitária; visamos à diluição da unidade, através das ligações qualitativamente distintas de seres diferentes, complexos, e únicos, e a reconstrução da unidade, mediada pelas descobertas públicas e, ou, particulares, dos elos que permitem aperfeiçoar as pessoas, com a vantagem do diálogo. Correspondemo-nos por escrito, o que já fora feito em ambiente da viva palavra; nossos ensaios e artigos visam estabelecer essa relação do escritor, que a fonte seja inesgotável, com o público, receptáculos febris a que destinará seu nobre vinho.

Em épocas de ausência de todos os valores eternos e profundos sobre os quais a humanidade sonhou e parece inerte, estamos ávidos, e criamos, em nossas sessões de trabalho, aos valores que nos guiam a vida.

Aos fortes o direito e a justiça. Aos hipócritas, o afogar-se em seu próprio nada.

“A justiça é vantagem do mais forte” – Platão, República.

Do seu secretário & escriba

Nenhum comentário:

Arquivo do blog