sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Augusto - Psicologia de um Vencido

Por estar mais próximo ao sol
o Nordeste é terra de gênio vivo.


Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância…
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme - este operário das ruínas -
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Navajo


Beligerância ativa

“O cheiro do silêncio é muito velho”.



Se nunca encontrei no jovem de espírito
tudo leva a crer que a virtude se não ensina.
Não há hoje bons ateus, céticos ou sofistas,
ao menos não na convivência daqueles que

aos altos brados dizem: “vejam, eu sou”.
O que encontro pelo caminho, e são muitos,
Só encontro hipócritas, fariseus apegados,
arraigados ao material desejo de grandeza,

Saduceus, os péssimos diletantes absen-teístas,
tanto na política, no discurso e na moral inversa.
Deus me livre do rigor escravocrata e do silêncio

na alma é a não opinião, e o nome aposto à coisa,
que não é o selo do silêncio antigo como a morte,
mas o da bitola, do cabresto e tudo isso: cadeias.

Francisco

The Quran

A poesia não é o exercício de se outrar?

Rainha de Copas

"Quando o cimo dos nossos céus se juntarem,

terei, enfim, um teto" - Paul Elúard.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Aristóteles

Percepção é afecção.

Pólo - Arist. Met. Trad. Nostra

[981a] Experiências criam arte,
empeirías tekhnen epoíesen
inexperiência, acaso.
apeiría tychen.

Isso disse Pólo, o sofista.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Tempo, espaço, emblema.

“Sonhei com um ninho em que os tempos não dormiam mais;
Sonhei com um ninho em que as árvores repeliam a morte”.
- Adolphe Shedrow.

A memória é feita de tempo sucessivo e emblema.
A memória organiza tudo em face de um dilema.
Como levar o espaço se a matéria não vem junta?
Temos tudo através de imagens coisa que ajunta

& se organiza todo espaço o faz através do tempo.
Os licores fortes são para se livrar o quanto antes.
No vinho do porto os açucares & os francos licores,
livra no ar seu espírito em ricos adornos e odores.

Quando aos quodores, trago a trago, os instantes
mudam na coloração e em seus traços, o grampo
cego que a tudo aproxima, na paráfrase do erro

& nas retinas, certas e infalíveis na rota do veleiro
se ao crítico gracejo das coisas tornas & entorna o
hábito apurado de tender a ser humano & profano.

Labiríntica trama

Como a forte e tênue teia
feita para resistir ao ar,
estendida vence o vento,
espargido som do lamento,
vinha forçar ao dia raiar,
fazendo a silhueta cheia.

Nunca uma coisa bela
tornou-se em uma noite
tão exageradamente feia.

Dês que outrora a noite
associávamos esse tipo
de beleza: círculo e linha.

Como quem na floresta
densa e plácida caminha
sabendo que não há guia
texto, barqueiro, que sirva
a Si na lúgubre travessia.

Paisagem anunciadora
na alma de labirínticas
tramas em que não se
porfia, altos e baixos,
na música e mímicas
sete corpos mortos sob
a relva dos teus dramas.

A consciência se domina
a memória, e, ou se teme
algum dano cobre a tudo
de escombros - e quando
se lhe perguntamos
pelas vítimas:
dá de ombros.

Do alto de uma torre domina
o vasto horizonte e o oceano,
suas vagas beirando
o continente adiante.

Apraz-lhe o mirante perdido.

Imagens

Há dois dias que o mundo não dorme
sobre os braços titânicos de um Atlas.
Atrair e repelir são coisas contrárias?
Mudam-se os sinais, apenas direções


percorridas na simétrica e atrativa
repulsão nas cargas que se trocam
na imensidão dos espaços, silêncio.
Interstícios temporais dos espaços.


Evola o ar os rumores e a fragrância,
o seu fôlego, ao distrair aos temores
o levará mais longe que seu desejo;

A órbita desgastada de meus olhos,
burilado ao auge d' sua fulgurância
tem no esteio do horizonte pousada.

Geometria do tédio

A paixão íntima do vermelho
faz-me ver Djins ao espelho.
A arte é o que nos impede de
cair ao sono que Hypnos cede.


Tudo o que vê sonha.
Nácar vê, Mutter-Erde!
Quantas noites a fio?!
As mesmas estrelas!


E o tédio produtivo na alma.
Topofilia do papel timbrado.
Espaço, defendido contra


forças adversas, amado
na emulação e nas surpresas,
pelo geômetra mensurado.

Abecedário

A alma carregada no mundo
de luz do sol sem penumbra,
reflexo feito luz interior, vai
todo aquele que já brilha, vê

visão de tudo quanto sem ela
não seria possível, além dela,
nem aquém dentro ou o fora,
na mesma fonte a de outrora,

a mesma natureza noturna
em sua crisálida, taciturna
recolhida em seu repouso;

lamparina bailarina diurna,
desabrocha em asas, pouso
na íntima paixão da poesia.

Ária

Nosso catolicismo... tão pagão!
Nosso cataclismo tem de cristão
as lágrimas arrojadas ao solo ínivio.
Palavra de um inveterado ímpio.

Tão ciosa para tudo quanto há
em seus álibis cerca oasis, Ísis
não tivera o cuidado de fechar
a porta dos fundos e a Osíris

mal-fadado, arrojado todo intuito
perseguido às sombras do intuído
real mais que imaginário.

Onde estão as imagens dos quatro
elementos primitivos princípios
das cosmogonias intuitivas?

Finitude

Ora finitude, que um raio me parta!
Onde que o natural movimento cessa,
ou apenas a tua consciência interessa?
Pois eu digo: não há o que aproveite.

Atravesse-a de uma ponta a outra,
se é capaz de trespassá-la te lança,
a garantia é que não há nenhuma.
Sábio não sabia, cria no que desconhecia.

Pelo mesmo motivo que o antigo cria
o moderno não crê hoje em dia.
Exatamente o medo do que desconhece,

e do seu salto artificial não desce
a ver quando a mente estremece,
dolente perante a fé que no horizonte se insinua.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Noli ire, fac venire

A força não se dá,
toma-se.

Apenas por elegância
sem rastro de arrogância,
e porque repugnância
bem soa a boca de uma mulher
o contrário: atração;

Por minha mãe ter me feito assim:
polido e conveniente,
não recuso duas vezes o oferecido,
contudo, o conteúdo não lerei,
presumo o suficiente.

Sophia

Três mais uma -
não é que Sophia valha por duas,
é que são duas as Sophias.

Uma esperta, ágil e tirana,
outra áurea, sincera e cativante.
Distingue-se-as entre gestos
e palavras.

Na primeira a esperteza
retarda as palavras
que não fluem,

vira as costas sem ter o que dizer,
vai, mas volta para fazer
estragos ainda maiores.

II
A segunda toma-te pelo olhar
cristalino e pela naturalidade
ao falar de si na terceira pessoa.
Ingênuo, o rapaz seduzido por

tantas urdiduras, propiciar
a sorte somente a outrem sabia.
Não perdia de si parte alguma
pois viviam todas nos mais longíquos

recônditos ligados ao peito
inflamando... devido a imensa força
unitária que era no nome,

na noite breve que consome,
a lamparina alambicada
e a lamparina nítida e clara.

Sacerdócio dos Segredos

Noli ire,
fac venire.

Constam-Eilan morreu cedo fulminado
por um raio passageiro a ele endereçado.
Foi o primeiro a partir, tornou-se mensageiro
mui sútil e refinado em caráter e gesto.

Aos amigos e amada, Tristan e Sophia
atou com mãos em laços envoltas
as que ela dera antes todas soltas
prometida a outro que esquecera.

Enquanto Tristan refletia numa mecedora
Diarmid, recém-afeiçoado é vítima de trama
e calúnia, duelo na certa em praça pública.

Júlia sua amada e amante um beijo sequer lhe dera.
Em uma noite lancinante, com Stern, Maia, e Mürdin,
intervieram no drama cósmico cênico, para sempre e expandindo.

Pessoa - Livro do Desassossego

- Trecho 121.

"Nasci em um tempo
em que a maioria dos jovens
haviam perdido a crença em Deus,
pela mesma razão que
os seus maiores a haviam tido
- sem saber porquê.
E então, porque o espírito humano
tende naturalmente para
criticar porque sente,
e não porque pensa,
a maioria desses jovens
escolheu a Humanidade
para sucedâneo de Deus.
Pertenço, porém,
àquela espécie de homens
que estão sempre na margem
daquilo a que pertencem,
nem vêem só a multidão
de que são,
senão também
os grandes espaços
que há ao lado.
Por isso nem abandonei Deus
tão amplamente como eles,
nem aceitei nunca a Humanidade.
Considerei que Deus,
sendo improvável,
poderia ser,
podendo pois dever ser adorado;
mas que a Humanidade,
sendo uma mera ideia biológica,
e não significando
mais que a espécie animal humana,
não era mais
digna de adoração
do que qualquer
outra espécie animal".

Trecho inteiro em:
http://horuzonte.spaces.live.com/default.aspx

De Irlanda

Aos varões os louros de glória.
Às beldades coloridas guirlandas .
Em círculos de pedras antigas
celebram a galope com gigantes

a erguer megálitos imensos
tornados mansos cordeiros em fila
circulam pela terra barulhentos
quando as pernas avistam, as crianças bradam:

Mürdin mandou chamar a Kildare,
a dança alegre dos Gigantes!
Carnac, Malborough, Locmariaquer -

Lá está uma pedra grande alta e polida
erguida a guisa de altar, foi lá sustida
que foi possível a prima feita te deflorar.

Helena

O mais interessante que contam
foi como entre Helena, Atena e Afrodite
foi a dama na trama do imenso desquite
a heroína, inocente ou ciente ruína

da cidade de Tróia sitiada de heróis.
Os maiores costumavam bater-se, éfigie
dos seus a poupar exércitos, notáveis campeões
da fama e das pelejas, não inocentam princesas.

Sofistas e poetas o fazem. A Peithó, Éris e Thêmis
evocam, trazendo-as todas a um só golpe.
Para presentificares a rivalidade,

em um instante, duela quem a si coroa,
baila, pisa fundo o abismo
se não vira-te para o lance.

Arcádia e Campos Elísios

Fortuna, rainha megera sempre donzela,
indócil não há quem a faça envelhecer,
velhaca e propiciadora, marca de ter de ser:
Parca - Fiandeira, Distributriz e Inflexível.

Fora Zeus aos campos, longe aos olhos de Hera,
cortejar a nobre filha dos campos da terra,
Maia, e se o nome é arquético e coisa
a que traz a lume o astuto:

Hermes, mensageiro ou intermediário.
Alado pelas bandas de lá e da cá ia
e trouxe o gado de Apolo junto a um estábulo,

ou, em uma cratera na lua, já que foram precisas
e muitas! voltas do carro de Phoebe... sobre orbe
e Palas Atenas, a de olhos glaucos, como medianeira.

Ashem Vohu (Asha) [tradução]

Assim é dito no Ahunwar:
"Celeste como um lorde
deve ser escolhido".

Sagrado Asha é o melhor
dentre os deuses:
que é também alegria.
Feliz o homem que é
sagrado com perfeita sagração.

Admoesta et errabunda

I

Se consigo tens,
simples és feliz.
Que te does
doa o a quem doer.

O que tiver a sorte
dispensa e perdoa.
Mas tudo isso tem
um sentido:

a quem mais for dado
mais lhe será exigido.
Faz da sorte um fá sustenido.

Corpo que há, corpo que vai.
Mala a sorte limita e cai
numa vala e não mais flui

II

Os olhos cessam.
A entropia o diminui.
Ainda resta tempo
a perceber o que não sois.

Não mais teu cadáver
arrastará nem caráter
a te distinguir.
Cai o pano resta-lhe partir.

O grosso pano de tuas vestes
não dispensaste para o rigor
vigoroso de teu último fulgor?

Quantos anelos alimentastes?
Diante quantos anseios fulgazes,
em medo tépido não paralizastes?

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Bundahishn [tradução]

1. Como revelado pela religião do Mazdayanos (Mazdeístas),
é declarado que Ormuzd é supremo em onisciência e bondade,
imbatível em esplendor;
a região da luz é o lugar de Ormuzd cujo nome é luz infinita,
e a onisciência e bondade do inexpugnável Ormuzd
é aquilo que é chamado revelação.

2. Revelação é explicação de ambos os espíritos juntos;
um deles é independente do ilimitado tempo,
porque a região, a religião, e o tempo estão em Ormuzd
e nele sempre serão.
Enquanto Ahriman em trevas,
com entendimento atrasado e desejo de destruição,
está no abismo, e é o que não será;
e o lugar da destruição,
e ainda das trevas,
aquilo que é chamado “escuridão sem fim”.

3. Entre eles há o espaço vazio,
que é o que se chama ar,
[região] onde agora temos.

Vai! O quanto antes buscar...

"É inútil que durmas",
Borges - Heráclito.

A riqueza sempre esteve em quem dá.
Onde é que há isso na aridez da avareza?
Sem consolo soluça no estrépito da tristeza.
Onde estiver teu coração estará lá o tesouro.

Se por um sorriso dás tua roupa
ciente de uma nova a sorte te renovar
também aos olhos os seres,
então hás de louvar a morte,
para que ao fulgor
de novas auroras
sempre irrompa.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Sobre nascer pronto

Sofista, poeta, músico e atleta
a competir, contexto agonístico,
fez-se ouvir no rumor de um dístico
aos lábios sem perícia de algum janota.

Campina Grande,
há pouco,
numa cama imensa,
repouso louco,
a celebrar a vida intensa.
Vai ter sorte assim
onde quer que esteja!

domingo, 7 de dezembro de 2008

Inacabado

A sua prosa fala de boicote e de vida por viver. Pena que também não tenha tempo para escrever. Sabe que é das penas longas e no tracejar rápido como quem alarga a terra em seus gestos cósmicos, pois somente na infante candura da nascente há o mel da musa melífluos olhos enamoradas dos poetas, seduzida, encantada ou possessa. Quanda a vida dentro urge o silêncio e a falta urge na pressa a correr rápidos galopes não acompanhados. Firme e forte cerra na navalha dos lábios o que os dedos nos gestos fazem relembrar. O porvir, o passado, ficções sem a presença. Quadros postergados que tingem matizes estragados os olhos porque forçados na concepção a só transparecer o que há em si mesmo; como é em vão que se inuma uma jovem com ataduras de linho?A águia quer, o leão ousa, o homem sabe, e o touro cala. É ou não é uma mala se todos os vestígios somem?

sábado, 6 de dezembro de 2008

Mentira em prosa

Como alguém que busca revestir
O corpo com um manto falso,
O prosador lança mão do fausto,

Enfastiando em seu claustro,
Por tanto insistir na demência
De revestir o pleno em inocência

Com tudo aquilo que de si
Emprega mas que na coisa insiste em não existir.

Por não ver a coisa mesma,
Não sabe o que em si encerra
Ela em delícia.

Se não vê mais que espelho
Das imagens que lhe vão
Na mente insensível,
Tenta revestir a coisa do manto impossível,
De quantas coisas quanto nela não há.

Se lhe divisa no olhar tantas coisas alheias,
Todas as falsidades que em si há e pretende
Colar a coisa tantas coisas quanto nela não há.

Na ilusão oposta de afirmar a si mesmo
Com imagens suas por onde lá não está.
Aferroa o gado com o não-ser em brasa,
Cumulando-a de tudo aquilo que ela não é.

Se é que pode divisar o abismo insondável
Onde se deixa tragar no vórtice sincopado
E ritmado e centrípeto, é preciso ter-se perto
Para sentir se lhe a extensão do frêmito
A arrastar a vista dentro.

Na umidade ectipica de suas retinas,
Corpo regular prenunciador da aurora,
Propiciadora sem demora da informe
Ânsia do caos no coração indômito
Ao seio da realidade.

Toda a profundidade do rio
Que se abre a quem não o vê
Como espelho de glória.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Obnubilans

Cega para a polifonia anímica
do discurso onde a alma
expõe a métrica, troca as notas
e então perde o horizonte por eras.

Não vês, cega!?
Não lês o que vai na alma?
Seguro estou então,
na medida de teu glaucoma?

Não é em mim que há
como em Grécia e Roma,
uma cidadela que inflama
a custa da cidade lá fora.

Parto depravado e impúdico,
na sanha ânsia inexpugnável.
Pervertido dês início na ânsia
quis salvá-la, eu corrompido,

ébrio a aler apaixonado,
sensual fanático deplorável,
tarado incorrigível dês infância.

No sentido mais vil e infame...
Que me inflamem as têmporas
se penso em sexo o tempo inteiro,

dês o pendão do pensamento primeiro,
(optando ao invés de falar, trabalhar.
Não seria a filosofia um meio de distrair,

para então evitar do avesso sucumbir,
uma vez que não posso da amada gozar,
torno o sensual prazer em inteligível ardor

a inflamar velhos pistões
ao sabor dos corcéis tonitroantes,
repisando a terra e cavalgando as núvens,

no belo esplendor das serras,
ao encontro das pernas,
é entre o vazio das notas
que se faz a música em que erras.

Essa música eu não dedico


A ninguém.

Ai de minha vela que pelo mar singra
Inflama porque ama o vento & sangra
& se o traga o rodamoinho, que o traga
as plagas d´outro mundo e cesse a vaga
na crista dos dissabores que os amores
falsos causam a quem credita os ardores
aos alvores de outrem, dístico mefítico
Que ao prolífico não atordoa, do tétrico
som que reboa em vão quis te poupar,
Diabolus in musica, não ouves o rufar?
Se inda por bobagens te faltará o ar
& obsessiva tenha vindo me buscar,
não fique triste
que aos poucos
reservo a ternura,
& a uma só -
a ternura inteira.
1 de dezembro de 2008

Da força e grandezas negativas

III

A grandeza negativa,
bem entendida,
é como a sombra
que a distância
do referente
parece maior,
como o amor próprio
inflado de tudo quanto é falso,
por se parecer as coisas que busca,
mas não se é.

Diferença qualitativa:
saber é infalível,
a exigência sobre humana
é que seja sempre verdadeiro.
A opinião verdadeira
pode perdurar
por muito sob
a égide da qualidade
de ser verdadeira,
mas pode deixar de sê-lo,
e tornar-se não mesmo,
o seu contrário ou seu outro.

Por isso, de modo hilário,
diz-se casuisticamente:
“eu acho...” o que não se encontra!
E esse é o retrato do registro opinativo.

O que pesa mais afinal de contas:
o ser ou o não-ser?

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Tripudia

Como quem a própria revelia
sobre si e outrem sincero tripudia,
emocionalmente pouco eloquente.

Já me despi, jamais me revelaria
se não te achasse o que mais há completa
mas não é tão complexa quanto simples.

E se da alma minha se te a locupleta,
inteira torna junto a fogueira que te apascenta,
antes da tormenta, a única que te esquenta.

Minha voz não treme, do medo isenta,
acostumado ou naturalmente dotado
improviso, corrijo, reviso, digo lento,

não serei por entre teus ouvidos o vento
pois sei que do autêntico talento
vivem as musas enamoradas.

Livros e Putas

Livros e putas gostam de virar-nos as costas
enquanto se despem.
Parece ou não parece
que suceda o caso
da parecença ser tal
e encomenda?
O embrulho mudo
não revida agravos.
Senti nos urros bravos
o efeito dos murros
postergados.
"Oh, não me deixas
falar..."
A tendência é piorar.
No além-mar tudo
é mais complexo.
"Parece que não me ouve.
Ou apercebe-se do digo?"
Nisso sou com ela generoso.
Um bom ouvinte.
Melhor ouvinte que leitor,
melhor leitor que arguidor.
"Oh,...".
Se quiseres que eu rememore, repita:
palavra por palavra,
gesto sobre gesto,
curvas de boca a entortar...
ipsis litteris, o tudo-nada
que dissestes, diga-me,
que inda repito-lhe
os trejeitos, os acentos,
e os metros.
"Oh, não precisas,
não precisas fazer
isso".
Envolvente [...]

Aforismo

Cedo aprendi a desconfiar
das coroas de louros
dadas de antemão.

Antes de tudo não é minha peroração

É o que antecede.

Cega para a luz da imagem a efígie
verdadeira da coisa, no seu nome,
já lhe prognostiva a ânsia e a fome,
de buscar a silhueta magna, porta-égide

da eloquência trazendo no manto
as estrelas que vertem como o pranto
assim como luzilíneas centúrias
nos fios declinando te esconderias,

se fosse vivaz mantendo o eixo
na encruzilhada do destino
não a direita vetusto peregrino
mas a esquerda ponte do sexo

imagem sem nexo, sem desleixo
redonda tal um insigne seixo
que a mão se acomoda,
a coisa mesma se apoda

da mais alta estirpe
altiva e benfeitora,
carente e silente
ao que na alma leva.

Elpis

Ao mesmo esperança,
cabo do desassossego,
confiança nobre e parva,
que te concede a fiança.

Não insistirei em bater-me
com castelos ou moinhos
de vento, esbater-me
contra paredes vazias,

autênticidade no valor da ira
na plena potência,
quando supõe que do que irá
tardar na equivalência,

dos sentidos da vivência
com-partilhados dia a dia,
melhor ter tido a medida
do parceiro devido a lida

escrita perdida dos traços
bordados em fios e vasos
etruscos votivos, persas,
egípcias reentrâncias

labirinticas tramas
não dão cabo da infância
proporcionada ânsia
sofisticada de quinas camas.

Zênite e Nadir
tocam-se no entrevir
ao abrir os olhos a névoa
insana, aos sentidos ávidos

proclama:

Se de braseiro sempre viva
a chama violácea
não queima, arde e tempera
sob a lotús rosácea,

em rubi convalescendo
do bálsamo contrátil,
na côncava portátil, o
tátil portal aquecendo.

Petite deu-jeuner

Usa-se tudo de mim e mandai-me embora,
intensidade de meses em dias ou uma hora.
Voa e se não for firme, denso e forte,
deixa-me voar até que me liquide o corte,
não há em mim o que tema a minha morte,
porém, dela, dos parentes e irmãos me deu a sorte.

Apartai de mim o negrume frugal,
o veneno, a pá e a cal,
nunca estive tão feliz pelas escarpas desse vau,
ao sabor do manancial intenso,
vão-se as horas com a nau.

Se diminuir a tensão a corda estoura,
a dimensão do pasto é uma imensa lavoura,
que alguém cortou com mãos em tesoura,
guardando na algibeira o tesouro alheio,

e a tesoura os emolumentos ingratos
de serem dados a outros...

Apartem-se das cabeças inglórias,
a mirra, a ambrosia e os louros.
Sigam sempre os clamores
da terra e dos céus,
trazendo a noite porta-égide
plena envolta em seus véus,
- junto ti a si.

Antes que o coração me explora o crânio,
não deixarei que ela complete o seu plano.

Selvagem

Faço minha a módica selvagem:
alimento, uma fêmea, repouso e Arte,
devia eu o moderno dizer,
que da natureza inteira,
inteiro e parte, simultaneamente;

Que os movimentos dos membros
espelhem os movimentos do caráter.

O ser físico, metafísico
moral e consciente,

sua constituição sua liberdade
da vontade nobre e soberano,
dádiva ou aquisição sempre a mão
para fazer de si a prerrogativa do gozo,
não digas: não!

Ou será em vão teres nascido.
Como que diria? ... tão...

bela... precoce, eterna nela,
que o pensar e o sentir
sejam uma na entidade
única, apenas não seja
só! Nem a a deriva,
irrisória e irridescente.

Divisa de nosso espaço
para que em nós se abra.

Thanatos ouk te kai Eros

O animal que negou o instinto segue depravado.
O que o distingue, não isso de ser pensativo,
mas o usar-se da liberdade, se ainda não se vê privado,
da vontade, tamanha falta ao prazer é cansativo.

Cativo em sua concha, com a inércia do sentimento,
lúgubre tormento causa a alma do homem verdadeiro.
Parceiro na fruição, benfazejo é o auxílio primeiro
para quem se queixa de tamanha preda, pensamento
[afunda e erra]

tímido em meio ao selvagem assustado; coragem no brado!
forte célere age por impulso, sem o infortúnio do obtuso
meio que erra o alvo colimado, acertando a qualquer obstruso

intruso, patife de pérfide marca maior, com seus asseclas obstinados,
egos, que até acredito equivocado sincero, que nada! um perverso,
que não faz as vezes dela, velho e morto nas calças; tão diverso:
é Eros que corre célere e pelas montanhas as escarpas inflama,
com o terror emanado de seu verso.

Se não propicias

Se me recusas a fertilidade,
a sinceridade tua umidade,
que lhe propicia as partes,
não tenho eu de me dedicar
ao pensar, ao discurso,
em suma, ao trabalho,
labor infame e diário?

Ou teria eu de buscar
a isso em outra?

Como na helena terra,
a negação da fertilidade
do árido solo montanhoso,
faz desenvolver o espírito,
bravio, forte e até jocoso,
quando troça de um perito.

sábado, 22 de novembro de 2008

O não perdeu, em vão pediu

"Onde o Homem não está,
a natureza é estéril".

[Eis, então, que:

Na senda da confusão minha alma dourada reta reboa
outrora dócil em seu manto roxo, nas veredas da paz;
ora inquieta, trilha a via que a conduz a tumba e jaz,
cinza, enegrecendo os ossos até que silente lhe roa

os corpúsculos irrequietos que aos mortos transformam
do justo homem na casa materna tornando opaco
os olhos sorridentes e a boca macilenta retornam
para desespero daquelas, embora não o soubessem fraco

ignoravam que o seu fim devia-se a má dona
que na covardia de sua realeza fora fraca e tola
e em sua renúncia fez-se da coroa indigna madona

descoraçada e atordoada, no lamaçal, ela frívola
chafurdou atoleimada, eivada no seio da inação,
à natureza divina, após o amante morto, em vão,
[implorou o perdão.

Sábado, 22 de novembro de 2008;
[13:48/13:51]

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Horizonte

"Torna-te o que tu és"

Eu sou o que sei.
de ti e de mim...
de outrem;
o que não sei,
e o que esqueci [?]

"Procurei-te em mim,
encontrei-me em ti".

Horizonte que se me expande.


Aforismo

O mais ébrio diante a vida
torna-se o mais lúcido
de ante a morte.

Devir

O que advir
há de vir;
ah, devir
irrevogável,
indeclinável
que te inclina.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Iniciação - Eros e Psique (PESSOA)

O cúmulo da realidade conforme a rima,
mais que isso a realidade mesma
não consente.

Não dormes sob os ciprestes, /

Pois não há sono no mundo. /
...... /
O corpo é a sombra das vestes /
Que encobrem o teu ser profundo. /
Vem a noite, que é a morte, /
E a sombra acabou sem ser. /
Vais na noite só recorte, /
Igual a ti sem querer. /

Mas na Estalagem do Assombro /
Tiram-te os Anjos a capa. /
Segues sem capa no ombro, /
Com o pouco que te tapa. /

Então Arcanjos da Estrada /
Despem-te e deixam-te nu. /
Não te vestes, não tens nada: /
Tens só teu corpo, que és tu. /

Por fim, na funda caverna, /
Os Deuses despem-te mais. /
Teu corpo cessa, alma externa, /
Mas vês que são teus iguais. /
...... /
A sombra das tuas vestes /
Ficou entre nós na Sorte. /
Não ´stá morto, entre ciprestes. /
...... /

Neófito, não há morte. /

domingo, 16 de novembro de 2008

Tautologia

Deus é.
A vida é.
Deus é vida.
Energia sutil,
pura e forte.

Caminho lunar:
a vida humana.

Caminho solar:
sabedoria divina.

Amor, calor e luz universal.

O tolo não percebe
a analogia.

No homem:
A imagem é a vida.
A semelhança, a inteligência.

Limitante é a demência
do antropomorfismo.

A fauna é feroz

I

Vimo-nos olhos nos olhos,
olhos nús, a inebriante luz,
vinha de ti a mim e a ti
voltava nos fluidos oléos,
do aloés à mirra, a azáfama
de gritos nos ritos instintos,
incendiava o ritmo o ímpeto
na cena que era de um fogo
em luz pálida e, na voz atroz
fez-se do tráfico dos gozos
o tráfego cósmico do comércio
na via lúbrica e espiralada,
pela qual subias e a descias
docemente desvairada
o augido abismo da torre
de prata donde vias em ti
e sobre ti vibrar no porre
do brilho metálico regular,
a chuva de prata a inundar
dês a ponta do dedo anelar
pós todo o jardim adentrar
dos pés ao alto do edifício
monumental estátua de
mármore em movimento
natural cinzelada perfeita
e eu, um outro que tal,
destinado ao porto breve
onde resido qual uma nau
tua bandeira a coroar pau
cego do ciclope a forja acesa
portador do fogo dentre
as pernas toca o ventre
odorífera represa que
o vermelho e o branco
liberam na corrente
viva e funérea que
retesa e insufla
a nobre vela.

II

os olhos vinham de baixo
e subiam pela esquina de
aquela vinha, nem sei de
onde vinha, como ela de
ninguém mais viria a ser
tão rica, saborosa, erradia,
ao pé da selva tocata a magia
ao pé do coração a taquicardia
no alarido louco da visão se ria
esconrregadia a noite vinha
para engolfar o dia e esplodir
o branco da fotografia,
no delírio lúbrico, cálido
e espiralado, onde torna
a ti o ser alado, no tumulto
de formas incertas com os
dedos na meta a iniciar
os movimentos insignes
que ao mastro sustenia ereto
onde via direto, claro e certo
o movimento secreto de tuas
ancas nuas nas mãos minhas,
a percorrer a silhueta de suas
ruelas e vias, viés do continente
achado e perdido naquela
chama forte, multiforme e
tremulante, delírio perene
se ama, baila e cavalga louca
até que me derrame todo
e escorra por teu corpo
de entre a fresta, uma,
duas, o teu rijo e possesso
corpo na delícia do acesso,
rouca, sem a voz, trinava
tal canora ave ou címbalo
de prata, na dimensão
metálica do animal belo
jardim de cordas retesadas
de um pesado violoncelo,
velócino de ouro perdido,
e achado por um bandido,
que te retém infame, refém,
frente a quem não gozas...

III

Mas, diante o teu possesso
descompassado, o coração
aos altos e baixos, planalto
sucede ao vale e a planície
que antecede o novo início,
fim de gozar em teus seios,
os mais belos que já vi
e não vi...

IV

Não não vira, ainda,
pois não me cansei,
do teu rosto, não me dás
o descanso, desde que
inda vivi tão pouco de ti,
e ao menor indício, aos
sobressaltos, refaz-se o
planalto, píncaro do...

V

do desejo, novamente,
de um ponto a outro de
teu corpo ligar e que não
tardava um segundo pleno,
mui ciente do desejo de
deitar-lhe no corpo rente
ou em tua boca pérolas
com as quais à natureza
se coroa, inda que nalma
o desejo de mais dentro
roa, roa, roa e não voa
a columba dês que finda
mas não cessa a lauta dança
a seguir o trilho que é o ritmo
marcado pela baqueta sobre
que te lanças a dançar
embolia mística entrópica,
dança catártica da vida
que ao som dos ditirambos
surdos do coração se expandia
e que no corpo exalava o suor
melodioso e insidioso pelas
vias em que te respirava
rente as esferas macilentas
de teus seios em que tocava
com palmas das mãos, segura
baliza incerta no marulho
do mar que não deixava
o marinheiro mareado,
embora alheado de si
e nela entregue na sinfônia
do corpo que em suor e gozo
desfazia, química dos sólidos
que sutilizam e dos pesos
os corpos aliviam, sentia
ela no hálito quente da
boca que salivava a alva
do novo apogeu que se
inicia, não havia entropia
que chegasse para apartar
os corpos que entrelaçados
viam-se novamente em
movimentos ritmados
dês que um ao outro
já se de há muito sabiam,
e de tanto saber-se que
bem se saiam entornava
em círculos ao clitóris...

VI

De assalto por trás tomava-te
no ribombar rápido fremente,
já demente sem o pensamento
que maravilha, nirvana alçado,
atinge através dafresta úmida
e barulhenta, ora rápida moção
ora lenta igual a respiração
com movimentos que não
cessavam e na vertigem
que a alma enlanguece
tece e destece o seu tear
no próximo prelúdio que
antecipa, e não será decerto
o último, dês que atônita
a ela confessa quase satisfeita,
ilusão, pois quando refeita,
torna a ele torna como quem
com o olhar confessa digna a
idade em que o querer é
de querer toda afinidade
daquela, só ela é capaz
de no ápice da tensão ser
atenta para a comunhão
do corpo com o sentir e
imaginar, e fala palavras
de alto calão ao fim do
dístico do duplo insano
movimento linguístico;

VII

O ébrio corpo não fatigou
e ávida quisera mais a ele,
e tornou a tomar-lhe o que
a animou deveras; vivazes
seus olhos eram como das
esferas coroadas pelo brilho
do sol acumulado em eras
o que não se podia precisar
em quantidade, apenas em
na direção, pois navegar é
preciso
pois quem se guia
por estrelas fixas decerto
que chega pelo fogo delas
ao porto de seus anelos;
suas centelhas a animar
as esferas rubis do rosto
nos diamantes do outro
repercutiam e novamente
as pérolas brancas verte
se as vir bem de perto,
nota que viver não é algo
preciso, dês que suas curvas
são como o delírio fugidio
onde perdido em ti a noção
de espaço me faltara, se
não fosse aquele beijo que
me animara a tempo de
possuir-te uma vez mais
ao rés do chão mordi tua
bochecha e prontamente
pedi perdão na procissão
da energia que da pelvis
a nuca pressagia o odor
do líquido em ebulição;

VIII

A rica alegria que havia
em teus olhos ao ver que
em sua direção se dirigia
o líquido quente e viscoso
em um só jorro, é infinda.
Tomara-me pelo cajado,
ao fazer ido e vindo descer
e estalar teus lábios...
ao redor do pênis como
criança sôfrega...

IX

e por mais que possuisse
o teu corpo possessivo no
instante do ato lúbrico ao
que mais ávida ficavas
ao que mais prazer te dava
se tuas unhas em meu
corpo fincavas sentia e
não o sentia tanto devido
a pressão que ao corpo
assomava no paradoxo
da dimensão brutal que
faltava na leveza do
teu corpo que partia,
ia até a lua e voltava,
quando parecia que
a órbita completa iria
não perfazer e se
trafegava por entre
estrelas que ao teu
ouvido sibilivam, eu,
então ao pleno gozo
retardava,
apenas para vê-la
satisfeita com plena
volta completa, dês
que voltava refeita e,
chamava-me ao ouvido
pelo meu nome
e dizia-me não haver
tido outro homem antes
de mim que a houvesse
visto dar a volta perfeita
ao cabo da desesperança
onde se perdiam as naus
na herança que o mar
reinvindicava e era devido,
tuas coxas nas minhas
se batiam compondo
de modo o mais formidável
a sonora luta de máquinas
infantes infames desafiando
a constituição atômica
no capítulo da vida
que exaltavamos ao
extremo e faziamos
da fraqueza da vida
o bailar sincopado e
forte impregnado
de força preternatural
para que não havia
limite ou termo que
se impusesse ao material:
nem sensível xoxota que
subira tão que na volta
do filme gravado
em um fio de diamante.

X

querer-se-iam matar
do modo mais belo e
ter uma morte gloriosa
entre um outro gozo mágico
a abstrair da morte
seu caráter trágico
e desejar fixar no gozo
do instante a memória
do presente na enternidade
distante pela qual
reviveriam e perdurariam
tal diamante
no emoldurado negativo
da maquinaria catártica
do um observador total
amante da bela arte dos
corpos que criou para
o seu deleite
e que quando dotou
o corpo do poderoso
leite jamais imaginou
o peso do atroz enfeite
da obra naqueles que
o sobrepujariam em
imaginação e na ânsia
torrida ganharam
a corrida eterna
chegando antes e
vendo a si congelados
no pleno instante
o corpo positivo
do filme gravado
em um fio de diamante.

sábado, 15 de novembro de 2008

Aforismo

Virtude de espíritos fortes: obstinação
e teimosia na ausência de destinação,
diante vício e convicção, Aleivosia.

Réquiem para meu pai III

A propósito da possibilidade de presenciar a...
e a translocação dos restos mortais de meu pai.

Após conversar amenidades é que tocamos no assunto.
Uma pergunta, porém, deixou-me aturdido.
Quando se quer que uma frase diga tudo, não me iludo.
Mesmo um colecionador de citações, deve deixar o dito,
pelo não-dito, quando a propósito da lápide, o que se pede
é a eternidade do escrito em confluência a brevidade do vivido.

A questão logo transfigurou-se em: o que de meu pai levo na alma;
Isso se deu às oito da manhã de um domingo, casa de minha avó.

Então, fui direto ao ponto: as experiências mais marcantes
antes do crepúsculo que antecede a aurora memoriosa,
assim raiou:

O teimoso pai fora aplacado pelo peso da medicação.
A insuficiência hepática (uma das causae mortis)
não lhe permitira depurar os efeitos nocivos da droga,
pois todo remédio para algo torna-se veneno para o todo.

Assim entrara em coma.
Como o soubera, foi um drama.

Bateram-me a porta figuras estranhas, femininas.
Boas notícias, desde logo, soube que não eram.
Do modo desajeitado muita dor trouxeram.
Se deuses não são, no prognóstico erram.

Desiludiram-me da possibilidade de melhora.
Pensei que era o crepúsculo, porém isso é o contexto.

Havia rendido mãe e irmã e ficara com o "moribundo",
toda a noite houvera-me impressionado a disritmia
do eletrocardiograma.

Eram planícies, planaltos do vale,
platôs e bips.

Haveria de ficar impregnado pela desarmonia
inda dois dias.

O dia iria raiar, já tentara dormia ao rés do chão frio.
Lera Platão para compensar a vaga do vazio,
mas interpretava o que lia sob um viés insano.

O dia iria raiar, e alguns movimentos lá fora,
fora do apartamento em que estava internado,
foram seguidos por algo que parecia uma melhora
no quadro que outrora me assustara:
como pode um coração assim manter-se vivo.

Enquanto dura o apego dura a vida.

O dia raiara e alguns movimentos me levaram
a examiná-lo mais de perto.

Levantei, fui bem perto, sentei-me.

Pouco depois pude ouvir um ruído de lábio contrito.
Irrompera o silêncio um grito: pedia-se a atenção dos arquétipos.

"Moça"!
Isto é, enfermeira, mãe, mulher... Nossa Senhora!?

Seguido de:
"Jesus Cristo"!
Essas coisas repetidas muitas vezes.

"Moça, meu deus,
Jesus Cristo"!

Isso quem repetia, como se mais palavras
não houvessem, era um "materialista histórico",
"dialético", supostamente irreligioso,
o que minha avó materna tomava por ateu,
pois que questionara as figuras acima ditas.
Para ele tudo era uma questão política,
ópio frente as condições materiais da existência.

Essas palavras se repetiam e de um modo insano
aos meus tímpanos feriam.

"Socorro"!
"Moça", aqui tratar-se-ia da enfermeira,
se não fosse o: "Meu deus, socorro, nossa..."

O que ele via?
O nada?

A completa falta de forma e representação?
O que são nomes? Arquétipos das coisas?

Aproximara-me hesitante.
O cheiro de morte que exalava do hálito
devia-se a falta de alimento que produz
certa enzima na falta;
a boca cortada de quem muitas vezes se mordera.

DOR!

"Pai, pai, estou aqui" - a princípio não ouvia.
"Jesus, Jesus, cadê... moça"!
"Puta que pariu, cadê a moça"?

"Pai, estou aqui... seu filho, acalme-se" - debatia-se.
Insisti muito, o processo gradual e lento do despertar
da consciência.

Com um tempo: "Chame a moça... água".
Busquei a dar-lhe, todo o seu corpo doia,
dobrar-lhe o corpo para sentar, odisséia,
o copo de plástico rangia a boca como lixa.

"Ai"!
A água no estômago vazio doia-lhe?
"Cadê a moça, tirem-me daqui" - pegou no fio do eletro,
queria arrancar.
"Deixe isso, pai", "escute-me, sou eu seu... Filho".
"Quem"?
"... Filho, mamãe irá vir, R... também, acalme-se",
"agitado assim não pode ficar" - apenas falava.
"Quem é você"?
"Seu filho, não me reconhece" - perguntei, ao que parou.
"Vá chamar alguém".
"Não há ninguém, antes das seis ninguém haverá além de mim".
"Quem é que está ai"?
"Seu filho" - caramba isso era como não ser o que sou.
"Meu filho?, meu filho?"
"Sim, pai".
"Meu filho, está aqui"? - senti-o envergonhar-se.
"Quer mais água, pai"?
"Sim, quero" - inclinei-o novamente.
"Minhas pernas doem" - disse.
Massageei-as, dobrando, a paralisia... doia.
"Meu filho, meu filho, está comigo".
"Onde está... tal"? - companheiro de quarto.
"Não há ninguém além de nós" - respondi.
...
"Meu filho, leia para mim, onde estão meus livros,
tem um consigo"? - respondi-lhe afirmativamente.
"Leia para mim, leia algo" - abri o livro a esmo (República).
Era o mito das três eras, ou das três raças... houve frisson.

A estória versa sobre a idade de ouro, idade dos deuses,
os deuses não se apercebiam dos homens, fartura e abundância...
Sucedera-lhe a idade de prata, semi-deuses,
que pela incontinência ou desmedida (hybris),
abandonaram o culto e o respeito, declínio:
a idade de bronze, era de heróis:
um Zeus, dois Prometeu, três Hércules.

Aquilo dizia muito,
noutro contexto talvez nada dissesse.

Lágrimas aos olhos, voz embargada
nas últimas linhas.

Os olhos de meu pai cegos a fitar o nada
também brilhavam.

"Filho"?
"Estou aqui, não me vês"?
"Não vejo nada, que coisa bonita".
Logo quis saber o que lhe sucedera.
Reconstituiu tudo de memória,
até o fio falhar, até uma sexta-feira,
quando lera o jornal a vez derradeira.

Era-lhe imprecindível saber a quantas
perdera o fio da consciência, repetiu,
e repetiu, havia um lapso, isso lhe oprimia,
era-lhe insuportável.

Tentei acalmá-lo, complementando-lhe
com o que pouco ou nada sabia, até que
tudo fez sentido e disse:
"Quiseram me matar".

Lembro que mês antes de falecer
ao encontramos-nos de quando em quando,
falara de sua idéia de monografia de conclusão
do curso de filosofia, tema: religião.
Problema: a concepção do deus vingativo e ciumento
no Antigo Testamento.
Pedira-me que o ajudasse.
Eu sempre absorvido em meus projetos,
ficara surpreso com aquilo, não surpreso
pelo que era um historiador.

Um mês antes, com o tio que fora o ensejo da conversa,
houvera confessado a fraqueza, entregara os pontos.
"Naquele momento ele jogou a toalha"
- confessou-me o que sentira.

Disse-me a ele que já vivera muito,
já vivera tudo o que houvera de viver,
seus filhos se encaminhavam para a vida,
haveria de levar no peito certa leveza;
a sua lucidez me insultava.

Não é que detestasse a vida e desejasse a morte,
a vida tornara-lhe um fardo pesado demais
a carregar, a morto tornara-se oblívio das dores.

Lembro de uma foto sua no calçadão de Copacabana...

Ganhar peso era sua obsessão,
pois desde a diabetes (causae mortis),
só o perdera.

A lúcida luz da morte.

Do dia em que "entregou os pontos"
até a morte contaram-se trinta dias.

Uma semana antes, bebericava
(causae mortis) escondido,
pela casa de minha avó,
madrugada a dentro,
rigor de insônia
compartilhada
por ela,
a própria personificação da natureza
que vivera para enterrar seus filhos.

Levaria de meu pai,
a vida adentro, três preceitos:

"Aprender com o erros dos outros,
é preferível a aprender com os próprios".

"Faça o que digo, não o que faço" - ironia.

"És responsável por aquele que cativas".

Muitas memórias de ele vivo,
em um jardim florido com minha irmã
ao colo, ambos descabelados...

Peixes, livros, vida e obra.
Flores, pássaros, a vida cobra.

O silêncio lá fora e na alma a ausência
de sentido às brigas que na natureza
das idades aflora, instantes de vida postergada.

Ausência de sentido - remendo e desatino.

[...]

domingo, 9 de novembro de 2008

Réquiem para meu pai II

*11.08.1961/+27.07.2006;

A propósito da possibilidade de presenciar a...
e a translocação dos restos mortais de meu pai.

Isso faz parte de uma crônica, o que não é hábito meu.
Crônica de uma infância sempiterna.

O corpo do meu pai que falecera aos vinte e sete...,
hoje soube, houvera sido exumado e transportado,
o que antes fazia e se era inumado, faixa acomoda
a face e sola, simulacro, sombra e duplo, no corpo,
horizontal e isento de sopro, sem luz e apartado,

mas não pude ir, se o soubesse iria, só para não fingir
que olhos não tenho e que por isso posso fugir
do convívio com que quer que seja,
ainda mais se é meu pai?

Não, é claro que não.

Ora, o que é, ei-lo:
A memória, a imortalidade de meus entes metafísicos.
Meu tio retirara seus restos mortais do jazigo familiar
removendo-o para outro ainda mais familiar e terreno:
Piancó, sertão da Paraíba, calor intenso e leve aceno.

O soube uma semana depois, dois anos e meio depois
do último aceno, se chorei, poucos o sabem irei contar:
foi ver minha avó aos prantos sobre o ataúde que
a terra iria tornar - a imagem própria da natureza
que recolhe seus filhos ao próprio seio terna fonte
da vida e de seu contrário, breve aparência.

Perdera, minha avó, coincidentemente os tios
que mais gostava, restou um dos que eram sete
e hoje são três, e que talvez goste porque mal
o conheça, andarilho que era.

Mas a conversa com a família de lado paterna
foi tranquila, e muito se o não disse, pois não
precisara, mas o relato do fim de vida de meu pai
a poucos daquele modo eu precisara.

Falei de impressões profundas que vão na alma
quando às suas não crenças e convicções renunciara
a mãe, ao pai e ao filho clamando.

Segue vivendo vivo em minha alma, meu pai,
parte com o eterno que é continuar
assim como em seus livros de síntese de história,
materialista dialética natureza da próprias história
que confundir-se-ia com a sua.

A memória vetusta, a memória.

Dizem que minha avó tem uma certa crônica moléstia
alemã se lhe diz o nome e manifesta a consciência
como falta de lucidez ou conexão.

Eu, particularmente, não o acho, ela mesma,
vejo quando se corrige no ato, e os chatos
são os velhos tão cansados de ser que só lhes
resta morrer como quem a terra chama.

Ela, terna, me reconheceu, e eu fui, enfim,
menos constrangido por não ter sido
reconhecido da penúltima vez.

Sabia que os semelhantes lá,
fariam-na lembrar as linhas convergentes
no rosto diligente de seu neto,
um tanto infame.

Difícil ter lá onde fora os dias findos,
que repercutem nos livros fundos e
profusos, alguns dos quais da autoria
dele, recuperei depois de tanto.

A frente da estante tão experimentada
e forçada sem a chave...
Pensei que
precisaria fazer aquele truque,
mas estava aberta...

Por um segundo lamentei que não fosse
preciso a astúcia.
Não é que vândalo o fosse
mas a sua sanha arquivista verdadeiramente
não tinha limite.
Sorrateira e materialmente,
surrupiou uma de minhas primeiras cartas
cujo conteúdo adolescente
que de modo eloquente e tolo
já dissertava sobre a paixão (11 anos).

Sentira-me ferido... em minha antes fortaleza
inexpugnável...

Assim como certo dia vi em círculos todos os meus
papéis ao chão, que coisa de curiosidade não sã,
deitava-se a saber do filho com que pouco
versava, malversava em frustração e brigas de um
tanto sempre falhas.

Lembro-me que digitava seus livros,
penas aos dedos, e que por cinco vezes
não me o pagara...
Mas que bobagem!

sábado, 8 de novembro de 2008

Angst

"Energia é eterna delícia".

Inexcedível em beleza
e fraca em vontade,
entrega seus desígnios
a outrem de mãos beijadas.

Evanescendo em ansiedade
e angústia (angst).

Bem ou Mal

"O Bem é o passivo que obedece a Razão.
O Mal é o ativo que surge da Energia"

Vão-se as naus com seus sumos degredos,
rumos incertos, pensamento e segredos...
rumo incerto das litanias tristes siderais.

"Vão-se os anéis ficam os dedos".
Isso mostra que o compromisso
futuro é falso frente ao presente
que é, enfim, o real.

Se por muito pouco tendes para mim
ou se menos e menor me considerais,
inda bem que não sabe e de todo eu
não disse, se incapaz dos olhos certos
tivesse e visse, saberia ao certo menos
senhora de si, pois a vontade é alheia.

Que se acha privilegiada, nariz e dedo
em riste, mas que coisa triste apontar
para o céu quando o céu em ti não há.

Distância glacial ignorante
do que é ser ao lado de um
que to permite luzir,
par alado,
lado a lado,
em costas,
calado.

Que nau é essa inflada,
que mesmo insuflada
por tempestuosa paixão
não se mexe nem age
atada em sua convicção?

Pia fraus

"Arre... estou farto de semi-deuses,
onde é que há gente no mundo?
Hipócritas, meus irmãos."

Arre, quanta frivolidade
esboçada por trás de
prolixidade.

O que palavras dizem
quando atos não acompanham?

Onde será que há honestidade
no mundo, senão no meu peito
para comigo?

Se apenas ai essa coisa encontra abrigo,
hesito e bailo eu no ar diante o perigo?

Eu não.

Nem no ar nem na terra revolunteio
nem água nem areia sobre os pés.
Triste é não saber o que és
e crer e teimar que se sabe.

Erra: pois dês criança teve
tudo como ampla megera -
romana senhora pior que fera
como nos circos consumada
ao sabor do sangue alheio.

Os fortes, pelo aparato de ser
como são, bela para mim em sonho
e vigília sincera nega tudo
nos movimentos sãos (pia fraus).

Mas não é que não era!

Re-presa

"Aquele que deseja
e não age
engendra a peste".

Quem não soube cultivar o desejo
refreia-se pois forte não é o ensejo.

Só o manancial que advém do sentir
direto e não indireto,
preenche a alma de anelo.

O medo é a fraqueza
do cálculo.

O fruir amplia o deleite.

A vazão do rio não é calculada
pela parede da represa.


sábado, 1 de novembro de 2008

De Eleita

"Um para mim vale por mil,
se for o melhor" -
Dignoscendis Pulsibus,
op. cit. Heraclito.

Silhueta silfíde os traços traz a fio envolta,
macio e rijos na figura esbelta, desenvolta,
seios e pés magnificamente nús
fazem do calor fogo, então a luz

esguia como dos raios de sol que nos chega
deslumbra ao dia e a noite abranda a chaga
com o espetáculo e a constância
que escapa e aprofunda na ânsia

de que tudo isso se repita no dia seguinte,
pois de outro modo não alegraria sentinte
já que a houvera escolhido como emblema

vivo, porta-égide clara, belo sutil diadema
ave canora de voz rara o fluxo do rio pára;
águas sonoras que ao dorido coração sara.

sábado, 25 de outubro de 2008

Complexa & Harmonica IX

Ilustre entre os números o nove é egípcio.
Numero hieróglifo da iniciação, o mistério.
Eneade articulada sobre triângulos mágicos.
Cuja alta coroa é mistério legítimo primeiro.

Osíris Pai, Ísis Mãe e o Filho, Horo.
Duas tríades para baixo, vilegiatura;
Além da Inefável palavra da altura,
Inarticulada ou inacessível ao homem.

Pleno ocaso onde do rio as águas somem,
Quando mais que dois sons num fundem...

Complexa & Harmonica VIII

Sola vera laudat philosophia homines veritatis rectae.

Fiat inde Xenophontis verum mandatum.

Lege omnes sophos ergo sic tuos.

Complexa & Harmonica

Coniuctio solem & lunam.

Species rara similia rem.

Magna obra natura cursum.


Sum enin ego quid sum?

Alliquid verum Gaudio esse

Parva NE minore misere


Vir! Ó, nata explendorem

Solis, magis non amat

Sine vera natura rerum,

Quid imago sui & altri est.


Summum Bonnum in Prima materia

& splendor solis & luna omnia veritatem ens.

Arva, Natura Lux in lucernae flos Amaericae.

Complexa & Harmonica VII

Dizem que cozinhar é pura alquimia.

Mas é da mistura que provém os sabores.

Dos odores quando se juntam os licores,

Pois é do choque que faz arte exímia


A esplêndida obra e meta da natureza.

Porção rara de cores. Amores e riqueza

De sensações, pois se o pensado é o real,

Devemos extrair disso algo fundamental.


O que há e sempre tirou o sono ao metafísico:

Que ser mau em pensamento equivale a ser

Mal, mau na realidade mesma.

Complexa & Harmonica VI

Colorem auroras enquanto lá fora

Em vertigem vivendo flor aflora

Enorme dengo forma do zelo enleio

A prenda se paga coroa-lhe o prêmio.


Flutua ao sabor da ânsia tua, força nua,

Flat da onda, a espuma onde Afrodite

Foi concebida. Do mito quero é que:

O que vier dela forme e me edifique.


Não segue rumores de almas bárbaras.

Procura ir e apreciar as essências raras.

Fazendo no sangue fulgurar e ribombar


Luz través do ar, cor oco a bombear

Ao sabor do vibrar e sendo o cheio

No tempo vazio verá que não veio.

Complexa & Harmonica V

Melhor pensar antes de falar.

Antes de tudo, melhor sentir.

O que amora, oliveira e uva

Tem que ver com o fremir?

Querer é tê-la ali onde é.

Fracassar é não saber lhe lá.

Tendo isto nisto reverberado

As fibras, as rimas e as cordas

Se me o foram arrebatados.

Não é causa de altercar com ela

É caso de compreendê-la.

Pois ela é causa e altera

No sentido mais radical

O que o tem se natural

Raiz for igual o teu real.

Digo basta de ser moderno,

Quero vestir do antigo o terno

E fazer versos alexandrinos.

Complexa & Harmonica IV

Se a corte está formada entorno.

Corto a fio da ironia o transtorno.

Ânimo exangue, o enxame rechaço.

Sangue no olhar castanho.

Do céu é o seu tamanho.

Dossel sagrado incólume.

Mão a tocha vem a lume.

Levo-a cingida ao braço.

Forjo forte como o aço

O arrimo que mantém

A tristeza anos aquém.

Complexa & Harmonica III

Meia lua inscrita a face.

Semicírculo;

Continuação de um sorriso que o rosto exímio

A poucos mostra.

Rigor do café negro que colara no colar do copo

A marcar uma concavidade ao lado de outra,

Ao lado do lábio inferior uma lua, também côncava.

Fino contraste dos grãos.

Finos, cheirosos e macios.

Recolhidos na face, com

Rubor incontinente

Que dos olhos raia

deixa ser o silente.

O celebérrimo o espetáculo

Não quis findá-lo...

Bastaria tocá-la boca!

Frêmito.

Até que outros chamaram.

Triste sinfonia dos muitos.

Ela teve de ir.

Não sei quê de eternidade

Coroou aquele momento.

Ela foi, mas o sorriso riscado,

E o sorriso somado,

Permanecem;

Tanto somos quanto memórias temos.

Complexa & Harmonica II

No deslize da seda

o declive é antecipado

pelo seio, eterno delírio

de um ponto fechado

dentre um círculo esfera

de naturais acomodações.


Formas para as quais há inumeráveis adaptações.

A falta do olhar pousado ao ombro a incomodava.

Outro fazia disso, se dava conta, nuvem sobre tela.

A gota de orvalho no fim da ponta do cílio era ela. [e não dela]


Tal a beleza brota em água e cavilhas

A natureza ávida como a lira dedilhas.


Antes que a cinza cubra o Vesúvio

Jorra lava quente e rubra, eflúvio

De força fatal ao ínvio nível.


Atônitos em face da chama

Acedem no corpo que clama

E ascendem tochas e amores

quais entregam aos fulgores


em torrentes de luz e calor,

sem saber sobra de amor.

Complexa & Harmonica

Branca e lisa como a seda roçagava a pele nívea a alça

Que cingia o ombro, píncaro nu onde a ver fixa o cimo.

Seja alto como roçagar da seda no corpo em que rimo

O alarido que brota vivo da silhueta, a forma não falsa.


Correspondem os olhos magnitude de orbes.

Frente porte-coroada de formidável cabeleira.

Distingue o denso do sutil a autêntica joeira.

Escada alta para cima e baixo pela qual sobes


Com braços livres ou ao corpo colados,

Alçados antebraços, esvoaça o cabelo

Em cortes conforme alguma das idades,

Recolhe aos degraus o efeito de afinidades


Tornando acessório ter ou não pés calçados

Já que nem ao chão se toquem pares alados

A encontrar face o que para lá há de belo.

Terra Devoluta

Eis que o cultuador da liberdade
dócil e espontaneamente se entrega,
como um gado se entrega ao cativeiro.

As coisas apenas aos olhos alheios se satisfazem.
Se olho para ela, eis que, surge em sua mente
uma promessa, uma paquera, nem simples flerte
que é com a natureza inteira, de cujo seio é imagem.

Mas se me surpreende a olhar ali nos olhos,
eis que lá já deveria ter encontrado eu uma fonte
de onde brotam beleza, bondade e... virtude,
coisas que até então passaram insuspeitas nela.

Descobri que não me satisfaz dormir em cama alheia.
É peso do exílio a oprimir minha alma.

Tão triste e escravo quão mais distante de si.
Oh, ignaro peregrino, refaz-te no caminho,
sulca a terra e ara-a com seus passos de volta.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Vazio e Pleno

Ausência de quê?
Dia de muito,
véspera de nada.

Incólume sigo cheio.
Afinal onde quer haver
o que sente faltar?

Perde a liga quem a si boicota.

Alma cheia, horizonte
em vista vasta e larga,
cabe.

Olhos perdidos a fitar
a plenitude irridiscente
que ao olhar arrasta...

Só por lhe ser semelhante.

Feliz quem coisas na
realidade não separa;
uni-las é o que basta.

Seja lá ou cá onde
as quer ter,
o cor é caixa acústica
e vetusta a preencher
distâncias de som e luz.

Aforismo

Onde senão na alma do [si]
transubstancia forma e conteúdo?

Sacrário

Será o absurdo da sincronia,
expansão, vida em disritmia,
como se barco e timoneiro
no arco do céu o paradeiro

perdido flutuasse leve e ligeiro
a distinguir o traço particular
daquela que aguarda locupletar
parcela antiga em que era inteiro?

Volta, ó viva e augusta chama
a animar esse duplo veículo
faz disso o ápice do versículo

a relembrar todos que amam,
se por meios sinceros chamam
não é senão a si que reclama.

11 de outubro de 2008.

Devoluta

Vejo nas estrelas.
Tantas vezes quão tudo parece disperso,
o universo finito e o infinito, seu reverso,
caótico, desde o início.

Ordenar é ligar pontos.

Vozes e barulhos que o mundo e a gente
faz; o que há é o que fazem.

Tese fraca:
Pensar é tender ao repouso.
Sentir é desejar movimento.

Tese forte:
Pensar é repouso.
Sentir é mover-se.

Dom Segundo Sombra

Dublê de mim mesmo
sigo como sombra.
Vi-la surgir no umbral,
pórtico com a penumbra.

Senti o coração na porta,
a boca seca e torta,
plumas de ave a altura
do peito, assim a vi.

Em mistério envolta, brota.
Tamanha beleza não há
de buscar na natureza morta;
dizê-la tal qual é, genial façanha.

Voa a esmo a borboleta
e o morcego, cujo nome
é Consciência. Aquela,
leve e primeira, Sentimento.

Corre a galope, de um lado,
um corcél negro, doutro,
uma égua branca, que se
lhe chamavam Ventania.

Força cega que
força a fio de faca
o círculo hermenêutico
da história a seu favor.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Questão de ver

Tão diferente de tudo quão mais reais.
Não sei sob quantos modos sois diversa.
Olhos que não conheçam fim hei de pedir
ao deus, por muitas eras mais,

como dizê-la musa boa e bela 
sem ter que pintá-la em prosa?
No comércio com a natureza
tive a mim com o que sei dela.

Nisso, a refutação resulta vantagem
para o refutado. Ágeis por vias agem
a memória exímia a pregar-nos peças;

croquis perdidos nos passos de caleças.
Em rima é outrem o quem escreve,
quando do ritmo de cor se serve.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Sorriso Guardado

Homília ao estar-a-ser criança,
12/10/2008.
[Verso, sorriso guardado].

Emprego tática,
escrevo não sei porquê.
É um fio de música 
na clareira dentro...
Ei-la.

Não mais corpos infantes
correram ruas como antes.
Deixa-se o pega-pega,
para trás o esconde-esconde,
mágica infantil e leve.

Por que será tão breve
o período da rima sempiterna?

Como dever ser a alma plena
coisa que a vontade inclina:
miríadas de sensações no laço,
comboio de memórias traço,
trazendo na alma qual cisterna
o amanhecer e a luz eterna,
reflexo do qual como farol,
gira a lanterna acesa em caracol,
a subir e a descer,
conforme calha a sorte
dos que vivem após a morte...

Ao longe o monte uniforme,
um ponto onde tudo dorme,
logo irradia e consome.

Abraço

Aperta contra o peito direito
o peito esquerdo, o coração
em abalo, na forte emoção
reaviva o encontro estreito.

Não é nó, mas um laço.
Firme não quer soltar.
Dá a frente um passo
e alça ao alto o braço.

Mister é que se diga
quão bom o amigo
quão quista amiga

pois não é se to digo
o mesmo que sinto
ali onde não minto.

Bola de fogo perfeitamente circular

... as pedras tem êxtases ao luar -
A.C. cit ex contexto.

É preciso confessar isso:
esse poeta místico... sou eu.
É o que da refutação resulta.
Quando é luna como musa,
que nos vêm e admoesta.

Ao verso, idéia, ato,
é justo corrigir.

O bom e belo no agir,
o belo e justo é lícito
dizer muitas vezes.

Quem provou da amora,
assim ou do fruto da parreira,
sabe que se deve ir-lhes aos bocados.
Ninguém come amora uma a uma
se deseja ter disso experiência.
Reuna-se muitas na mão nua
e toma-as de uma só vez.

Bebericava e alterava-lhe a tez,
marca de que aos quodores
se esvai pouco a pouco a sensatez.

Simbolos de familiares odores
dos vinhos que se guardam em odres.

Aos pequenos tragos
se evita estragos.

Franqueia lisonjas
quem se com porta
com espírito nobre,
que com o vulgo
sequer se importa.

No misto das amoras
o contraste dos tipos.

Faz da mistura
o bom tempero,
acétil, citrino, doce.

Encorpado ou espetado
o vinho nas pontas das
papilas acomodam-se.

Candeeiro que arde
no peito qual braseiro
noturno e interior,
auto-alimentado.

Bola de fogo ardente,
perfeitamente circular
despenca no seu ulular
a cabeleira luzente
imensa. Nau na procela,
lenta a singrar eminente,
ondas azuis em aquarela.


terça-feira, 14 de outubro de 2008

India Três

Brahma, o puro Atma
em Purusha viv' alma
que reflete sobre isso.
Níveo lótus ou narciso

os lírios eternos e bravios,
bravata guerreira e sábia
tal Krishna, os contrários
tocam olhos em plena Maia.

Brahman, Verdadeira tríplice
mistérica onde Vishnu
e o terceiro fogo, Shiva,

pois para que tudo viva
devem tornar tudo uno
no múltiplo e natural índice.

Alquimia, calor e suor.

Quamquam animum turbatus ero, (fataliter angor
Omne nefas sequitur) tamen haud mihi tantus anhelam
Deiciat mentem pavor, ut vi victus et expes
Indignantem animam tristi cum murmure fundam,


Na alquima do verso a essência linda
no aloés transmuto o denso em raro,
com rico manejo da mimese preparo,
o sol central da representação infinda.

Com ortoépia e pedante prosódia a face pia
claro como um girassol que ao sol procura.
Ao tangenciar consigo obtém de si a cura
seguir paciente rente ao ouvido de quem lia.

Tornar-se pedra dizia um poeta místico
era não ter coração ligado a nada
já que encosta mas não entrelaça.

Pensar essas coisas, que a falta do mover-se
resulta da ausência do calor, naqueles que em si
o ardor não provém de uma causa externa,
houvesse levado em conta aquele dístico.

Uma tristeza demasiada não condiz 
com a natureza humana...

Ah terras prolíficas,
de ondas caloríficas,
de mão e solo gentís.

Peito refeito sem ardís,
as velhas e toscas charnecas,
as barrocas canecas
das ânsias comuns.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Zero

Zero grau, porém, a mente inda pensa.
O frio extremo predispõe-me a inércia.
Ao sentir que sinto, surge a consciência.
Assim, a si mesma tem com a presença.

Será tornar-se pedra início da demência?
Ai de mim que ninguém terá clemência.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Canela

Através do boulevard
somos levados.
As calçadas adentram
as vitrinas.

Difícil não ser arrebatado.
O espírito forte
vê-se quebrantado.
Os pés seguem o traçado.

A consciência do flaneur
está atado a aba do boné.
É necessário a orelha cobrir,
mas o cobertor é mister

prontamente descobrir
da arada terra ao ínvio éter.

Ajoelho a terra rente o joelho
esquerdo, na rótula ao chão.
A arquitetura sacra faz do eco
interno preces ao céu elevar.

Não estou atado aos genuflexórios
por isso ando como um burguês,
apesar de não sê-lo,
tamanho é o zelo.

Canela, RS - sete de outubro de 2008.

sábado, 4 de outubro de 2008

Dia Lunes

I
A uma certa Luna
dirigi-me estrênuo.
Para dizer que só
isso é divino,

o resto é um sonho,
é memória do homem.
No embahir... de mim,
pus-me, não sei assim,

nem como terás a mim.
Sê consigo, se é afim
de te saber junto.
Com os dedos a fôrma

unto. Para preenchê-la.
A forma, dobra-se dócil.
Não há sequer ócio
a fazer mão cheia.

Nas idéias que ligo,
no oculto lido antigo
inciso vinte e dois,
parágrafo seis... a tez...

II
Esse código que refiro
foi escrito e perdido.
Logo prefiro na noite,
a luz do dia, e largo,

de lado o comparar.
Volto a decifrar
o que é dívida:
dizer o devido.

Da imagem duvido.
Riso liso e obtuso
por fazer isso que
não ouso...

Dar vez às idéias
da voz que me deras,
do pouco bastante
para preencher

cântaros de alma
a fundo, e no alento,
no sopro lento,
e de braço aberto,

faço azo ao enlace.
Quando vieres,
e se disseres,
que haveres

há de haver...
intempéries.
Sobrevenham,
ou não.


III
Não são vãos
os votos ignorados?
Nem o prolífico
ímpeto que a vela

inflama sopra certo.
Não apaga a chama
mas, rasga a carne
e costuma sangrar.

Sempre ao luar
houveram reentrâncias.
Por querer perpetuar
existências...

Dispensas as mãos ágeis.
Vê como são frágeis
os humanos desejos.
Frente aos corpos

encontram-se doces
e dóceis os corcéis que
na escalada em fúria
escapam à ária,

e a mão técnica
do artista, foge,
passa, imprevista,
pois são mais reais

que os iguais
pois são diferentes.
Fluem ardentes,
e não se deixam

fixar pelos pincéis;
o mais se queixam.
Cinzelar, não se pode,
pois, se apagam as leis.

São Paulo, quatro de outubro de 2008.

Aurigas Imortais

I
De um tipo.
Somem todas
as qualidades.
Dispersas...
As massas,
os moles,
corpúsculos em
retirada retém
em si correndo,
por veias antigas
sem remendo.

Cortas o fio do rio
à faca rude. Lauta
canta dor a flauta.
Força em expoente.
Força em face alta,
soa a voz estridente.
És breve.
Sã, refulgente,
serás prática
quer na América
ou na Ática.
Muitas são as
pátrias que há
em minh'alma.

II
Mas, calma!
Espera um pouco.
Inda ora rouco,
a voz que embarga e sola,
deito riso e rola
uma leve lágrima.

III
Excesso de rima
faz da métrica
tétrica patética.
Ou erística grima.

IV
Lado oposto
ao rosto, vejo.
O eu que vejo?
Espelho oposto.

V
Reflexo de cima:
ciência ou cisma,
vivem os debaixo
a correr tal riacho.
As pedras do leito
rendem respeito
à brevidade; inda
que não cesse, finda
a tília e funda o vau.
Se espalha... A nau
a beira do cais
é o ás.
Apressai!
Que a partida
de tua vida o cúmulo
cobra ainda fama
a quem cinge
o louro
ou de ouro
o túmulo.

São Paulo, quatro de outubro de 2008.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Índia Dois

Distantes ele muitas verstas,
do sumo da uva e as florestas,
sabia q´as impressões nestas,
perduram e não pelos séculos.

As imagens quentes destas são
ilhas que brotam as milhares.
Doces e úmidos olhares sãos
tais frases túmidas honestas.

Auspíces, lhamas, especulos,
do báculo, arúpice e espadas;
o corte traz viva alma nestas,
se são o que em si guardaram.

Pelas tintas da alma firmes
preenchem as suas ânforas,
do cosmo tempera o tempo
igual ao que encerra o ciclo.

Se ao mover-se ressoa por eras
mede em centúrias as estréias,
enquanto os barrís de carvalho
permanecem & ainda quentes.

O cimo do céu caminha

Antes no fio do corte em espadas
que se medir na cohorte espáduas.
Nos jogos nem sempre a sorte
faz corpo como destino e porte

altaneiro, inflexível e cheio,
na ponta de pés, assim veio,
sem sapato ao rés, tal pluma
de ave que ao alto avoluma.

Antes que suma sem deixar
[rastros]
e a férrea pátria deixo o lastro,
repleta de imagens possíveis.

Límpidos mananciais visíveis,
onde riscam trilha os astros,
ou na solidão em insensíveis,
[mastros].

Frederica

Frederica La Prida,
rica fidalga da prata.
Lembrada como aquela
que não desconheceu a vida.

A beleza que é rica
e não a riqueza.
À sombra, o tempo
é mais lento.

Tão grande a dor
quão vazio de alento.
Na inocência de brincar

com as palavras, finjo
que elas tem sentido.
Mas quem [as] tem sentido?

In uino ueritas

O nata mecum consule Manlio.
Seu tu querellas sive geris iocos
Seu rixam et insanos amores
Seu facilem, pia testa, somnum.
Virgílio.

Dentro soçobra a vela no sono.
Aquela que antes, loucos amores
acendem no peito e inspiram hino
ora e meia o ébrio retira rumores

de ânforas de cedro e de barro.
Verídicas as coisas que ora narro,
sucedem a finesse e o desatino,
graus há da colheita ao refino.

Quão abrasador é fogo,
tão bela em riqueza.

Não vês que o jogo visa
o múltiplo na beleza?

Na taça esvazia o corpo
o corpo é análogo ao copo.
O espírito que no ar evolui
é a alma do vinho. Imiscui

o fôlego úmido e quente
a voz do afeto silente.

Índia

Sou um índio...
Não, não sou um índio.
Vendo bem como quem
repara um erro, percebo
que a Índia está no oriente,
e eu cá, ocidente de mim,
não posso ser senão oriente,
porém, oriente de mim.

Mas o que é ser para o oriente?
Outra coisa hilária,
sou outra coisa,
quase a mesma.
Nativo, chamo-lhe.
Da natividade da natura.
Por herdade,
naquelas quintas,
fizeram ameríndia,
a mãe e a pátria;
lingua que emerge em palavra,
canta em tua toada,
cabe ver da balada
cada um como assim o enerva.
Minerva mais a cor e o sabor
da uva, ela rubi e rubra,
aquela, azul e branca,
e vermelha e preto,
o seu contorno, lento
cinzelar do artifex da natura,
que de si nos presenteia,
da aurora a outra aurora.
Não fosse isso e poentes,
sempre novos, pois lá,
o vinho e a alma guardam
consigo exímia afinidade
não se se tinha a idade.

terça-feira, 30 de setembro de 2008

Vinho

Entre mim e a mulher o amor é a sombra
que bebe vinho e, se não lembra, soma.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Uadi

Falar de Scherazade é não tê-la visto.
Dizer que ela é igual a ti
e assim chamá-la sem a mira,
é adiá-la sempre ao crepúsculo do dia.

Mil e uma são as Scherazades,
se quiseres falar com verdade.
Dar a ti as mil faces
é não te saber una.

Se fosses uma não te a quereria.
Mas como sois todas elas,
quero a ti todo o dia.

Assim como fazer de ti a noite nua.
Descortiná-la em todas as tuas faces
& frestas, as ruas plenas antes vazias.

Sempre novo para que assim me aches,
em quatro e sete fases de tua lua.

Que não te falte aquele olhar,
que através das noites sem luar,
de rubro a tenda inflama &
no rubor da cama em seda,
a luz de tuas luas derrama,
e ao corpo-cálice entretece.

Em marés de frêmito
a alma enlanguesce.

Lembra-te do mito
que ao mar do amor
foi dado imitar o rito
enquanto vela &
ao corpo dela
entumesce.

Laço

Paráclito em nível ínclito.
Lado novo do velho, farto.

Tão somente o ir ter de fato,
com a natura após o parto;

Não há o que se não muda.
Vêde luz ante a matéria surda,
fazer-se cega frente ao desatino.

Oriundos da sede deste menino
como no silêncio da relva o leão,
nem repara que a sorte da corça,
no calor da noite, domina e força.

Tempo em ordem toda ab-surda,
a tramas solitárias não confundas
com as tuas, ainda isso surja
como lembrança nos vasos anímicos.

Laços de afeição em reparos rítmicos
reparam-se em estado de pura libido,
belas linhas tinham ilhas e seus istmos.

Inda quando dirigias-me ao nobre porto,
sendo a nau o meu e o véu o teu corpo,
tingias de ouro mel o vêlo do meu copo,
em delírios de lábios que me deixam torto.

Não lembras daquela tarde sem sombras?
Que o marulho das ondas em ondas,
saibam a ti fazer voltar. Compridas mãos
abrangem como raro estuário.

Nenhum mortal foi páreo
de cinzelar-te em rimas.

Quando do troféu te encimas,
não há o que se torne aéreo.

Mas quando deixas de queixas,
embora indo e te traga de volta,
tendo os versos como escolta e,
voltes agora esquecida das rixas.

Como nobre olfato tem o tigre,
e o vento favoreça a sua sorte,
fareja a vida a trilha da morte,
toda a procissão da plebe grei.

Em dias os quais ocultas,
o rastro doce do vinho insigne,
traze em signo noites devolutas,
mesmo que acordar te indigne.

Que isso a cultura ensine:
Faz colheita dos cachos da vinícula,
fogo alteado em fachos, viva a uva!

O teu altar ao frio não condene, mas,
volve o teu ímpeto de volta ao delta.

De puras liras a noite abraso.
Somente uma é para mim um vaso.

Furto-te às encondidas com sérios visos.
Vê-la caber no forte abraço.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Fulgiens

Fita a fronte a sua mente.
Como o que em ti sente,
Possa você passar rente
Às ranhuras de cada ente.

Descontínuas superfícies
Do real que se paramenta
Em ir e vir. Lembra-te:
O que és inerente a ti, é.

Veste o nobre semblante,
As augustas fácies, pois,
Veículos não são automóveis.

Livra do rosto o olhar evidente,
Mas se to delinear sua amante,
Beija-lhe ali o lábio, ó excelente.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Fragrância

Essência tênue de citronela,
Perfume etéreo e feérico.
Evola em tom esférico,
Átomo de si e da cidadela.

Ilustre e magnífico licor,
Hidro-mel de hoste prolífica.
Empresa, sobretudo pacífica,
Da colheita do fruto em cor.

Gracioso vai do sono ao templo,
Ante o silêncio e despe a camisa.
Tão somente do alento precisa,

Quem ao raro e puro contemplou.
Seja o libelo caro, anelo de outro.
Astro vindo de não sei quê ouro.

Rústica

O que há de melhor no mundo?
Qual a mistura certa do eventual?
O tempero na medida onde está?
Os céticos desesperam do factual,

Outros não querem ir mais fundo.
Malversações sobre o não habitual,
Quê por advir, se o nada sobrevirá!
Atual mistério maior que o Graal.

No plenilúnio iluminado pela ânfora,
Perguntou-se, o sujeito: há jeito,
Saberá ser o odre novo capaz, [rústica],

[Técnica] De suportar o vinho velho da ânsia?
O receptáculo deixará esvair a cânfora,
Ou suportará o brilho e a acústica?

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Koré Kósmou

"Whereas the east, O Horus, great in glory, in that 'tis thrown into confusion and made over-hot by the continual risings of the sun, and in like fashion too, the west, its opposite, in that it suffers the same things through its descents, afford the men born in them no conditions for clear observation. And Boreas with his concordant cold, together with their bodies doth congeal the minds of men as well.
Whereas the centre of all these being pure and undisturbed, foreknows both for itself and all that are in it. For, free from trouble, ever it brings forth, adorns and educates, and only with such weapons wars--on men--, and wins the victory, and with consummate skill, like a good satrap, bestows the fruit of its own victory upon the vanquished".

Emulação

Forte êmulo, esse que exerce seu empuxo sobre espíritos.
Quão pouco puderam contemplar em jogos, os perdidos,
Vãos entretenimentos abertos a custa dos sentidos verdadeiros.
Perdidos em jogos como em lúgubres espelhos,
Os que refletem errado sobre o neutro picadeiro,
Se ao conteúdo esquecido não ligam o paradeiro.
Do que vai no peito, o anseio, do tempo perdido,
Donde havia abrigo para o mais sincero anelo.
Espera você! Ai de ti! Quem vem lá?
Não mais sob tristes órbitas habitarás.
Dessa partida a natureza está farta.
Pelas murchas flôres trocou a horta.
Penitentes olhos seguem de soslaio o nome nas criptas.
Ainda o fôsse com os oiros e não com as copas...
Figurativa a folhagem pende de árvores mortas,
Tão fácil é fazer versos tão longos por essas paragens
Ensurdecedoras da palavra que não encontra o rumo.
As horas espraiam na litania do odorífero e patético fumo,
Aos que entretecem em perguntas tétricas miragens.

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